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Desde o início da pandemia de Covid-19, em março, a rotina na Unidade de Pronto Atendimento de Duque de Caxias mudou completamente. O trabalho virou uma montanha-russa, com momentos de tensão e tristeza, mas também de solidariedade e empatia, além da vontade incessante de vencer o coronavírus. Um casal de enfermeiras tem sentido na pele esse turbilhão .

DOIS LADOS DA  LINHA DE FRENTE

Os desafios de um casal de enfermeiras em meio à pandemia

Camila Hucs e Luana Ayres

Enfermeira há 15 anos, Danielle Alves Pinto, de 43 anos, atua na linha de frente do combate ao coronavírus na UPA. Sua equipe hoje tem apenas mais uma enfermeira, Joyce Regis, de 29 anos. As duas são casadas há 4 anos e dividem não só a vida mas também a emergência de portas abertas onde se conheceram e trabalham até hoje. Para Joyce, a conexão que as duas têm é o que ajuda na correria dos plantões. "A gente consegue se entender muito bem e isso acaba passando para a equipe, é ótimo ter a Danielle como minha dupla". 

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Elas se dividem entre a triagem e as salas amarela e vermelha, onde encontram-se os pacientes internados. A realidade no dia a dia é improvisar com os poucos recursos que têm. Em meio à pandemia, muitas vezes as enfermeiras tiram do próprio bolso o dinheiro para comprar os equipamentos para proteção, como luvas e máscaras. O aumento na procura por esses materiais faz com que estejam em falta para quem realmente precisa deles como instrumento de trabalho. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), a ausência desses equipamentos de proteção põe profissionais da saúde em risco, pois estão em contato frequente com o vírus e podem, por isso, desenvolver as formas graves da doença.

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Danielle conta que, no início da pandemia, os pacientes que chegavam com sintomas suspeitos de Covid-19 eram colocados em uma sala separada para aguardar o atendimento e recebiam máscaras oferecidas pelas enfermeiras. Depois passavam pelo médico para fazer uma radiografia do pulmão e, caso a imagem indicasse comprometimento, o paciente era transferido para outra sala onde tinha acesso a oxigênio e cuidado específico. Mas hoje o fluxo mudou devido à alta demanda de infectados. "A nossa emergência passou a ser uma emergência de Covid. Todos os outros casos, como infarto e acidentes, são a minoria e são atendidos separadamente", diz Danielle. Segundo a enfermeira, de 100 pessoas que chegam à emergência, 90 são suspeitas do novo coronavírus. Danielle se sente impotente cada vez que perde um paciente para a doença: "Na unidade, hoje, nós contamos com um respirador, ou seja, muitas vezes não tem o que fazer pela pessoa, por falta de equipamento". 

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Joyce também se sente frustrada diante disso. “É difícil ver situações em que você não tem como dar a devida assistência aos pacientes”, diz. Com a intensa procura por atendimento nesse período, às vezes não há material, suporte, nem equipe, pois ficam todos saturados. Apesar de presenciar momentos difíceis, ela sente prazer e orgulho em exercer a profissão com que sempre sonhou. Enfermeiros merecem ter o mesmo reconhecimento dos médicos, ela diz.

 

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                               Me dói ser tão desvalorizada"

De acordo com Danielle, a realidade da pandemia é diferente da percepção que muitos brasileiros têm. Na unidade onde trabalha, os pacientes idosos são minoria: "A população ainda não entendeu que o vírus não escolhe faixa etária". Ela conta que já presenciou morte de pacientes com 16, 17, 25 e 37 anos, alguns com comorbidade, outros não.

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Danielle se formou em 2005, na Faculdade de Enfermagem Luiza de Marillac, e já trabalhou no Hospital de Cardiologia de Laranjeiras, no Hospital Cardoso Fontes, na UPA de Manguinhos e numa Emergência Psiquiátrica. A motivação para escolher a enfermagem vem da infância: o cuidado e a vontade de socorrer sempre foram características fortes suas.

 

 

Minha família tinha muitos idosos, por isso desde pequena eu convivia e cuidava deles, então resolvi fazer enfermagem para aprimorar isso".

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Para os profissionais de saúde, esse é um momento de preocupação, medo, incertezas. O Conselho Federal de Enfermagem (Cofen) aumentou o número de profissionais especializados em saúde mental para oferecer voluntariamente ajuda aos que estão na linha de frente durante a pandemia do Covid-19. A maior parte dos pedidos vêm, justamente, dos estados mais atingidos: Rio e São Paulo. Mas há procura do país inteiro.  

Segundo a Secretaria de Saúde do Rio de Janeiro, o estado nesta segunda-feira (22), registrou 8.933 mortes e 97.572 casos confirmados de Covid-19. Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, é o segundo município com maior número de mortes (372) e 2.655 casos confirmados no total. A Prefeitura de Duque de Caxias e o Governo do Estado disponibilizaram, por determinação da Justiça do Rio, 56 novos leitos no quarto andar do Hospital Municipal dr. Moacyr Rodrigues do Carmo, para o atendimento de pacientes. Outros 91 leitos deveriam ser concedidos até 21 de Junho, mas até agora não foram entregues. Dados do Cofen informam que já são 157 óbitos de profissionais de enfermagem, entre eles: enfermeiros, técnicos e auxiliares.

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Além de se preocupar com seus pacientes, parte de seus pensamentos estão voltados para a família. Em um ambiente onde já há muita tensão, Danielle ainda tem que lidar com a ansiedade pelo estado de saúde de sua mãe e seu irmão. Mesmo morando no apartamento abaixo do de sua mãe, não recebe um abraço dela há dois meses, desde quando a quarentena começou. Ter alguém como Joyce ao seu lado, que entenda e compartilhe os sentimentos, é o que ajuda a manter a mente forte diante da saudade.

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No final de todo plantão, Danielle vai embora com tanto esgotamento mental e físico que mal sabe dizer qual deles é maior. Ao chegar em casa, retira os sapatos, limpa com água sanitária e vai direto colocar suas roupas sujas em um cesto específico, para evitar que o vírus se propague. Em seguida, entra no banho e lava todo o seu corpo com cuidado. A preocupação afeta suas noites de sono, com pesadelos constantes por passar o tempo todo com medo. Dorme pouco, acorda assustada, liga a televisão e assiste a desenhos animados para se distrair e conseguir descansar. “Quando os números começam a virar rostos conhecidos, a gente começa a se desesperar. As pessoas têm que levar a sério, porque a coisa é muito pior do que se imagina”.

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